Ao finalizar a campanha dos quatro diferentes álbuns musicais (ou “mundos”) em Ape Out, eu finalmente me senti satisfeito com a experiência que tive. O novo jogo do game designer Gabe Cuzzillo tem aproximadamente quatro horas — a depender da sua habilidade como jogador —, tempo de jogo suficiente para que eu pudesse dominar suas mecânicas sem sentir tédio ou frustração.
A fuga do gorila
Tecnicamente, Ape Out é um jogo de ação beat ‘em up com uma perspectiva top-down — isso significa que seu objetivo é controlar “de cima” um personagem que vai deliberadamente socar tudo e todos a sua frente até chegar a seu objetivo, o final da fase. Parece tão simples e datado, vide o histórico repetitivo desse gênero, mas é justamente aqui que a conversa começa a mudar de rumo. O combate se dá por meio de “agarrões” e socos enquanto o primata se movimenta em busca de um local seguro contra os disparos efetuados pelos inimigos. Os inimigos têm localização fixa a cada nova tela e abordam o animal de diferentes maneiras, quase sempre se organizando em grupos de mais de dois indivíduos. Evitar disparos por meio de reações rápidas, bem como planejar sua rota de acordo com a quantidade e o posicionamento dos inimigos nas fases mais avançadas, é essencial para que a fuga seja concluída com sucesso. O ato de projetar outros elementos presentes no cenário em direção aos inimigos, como portas de aço e membros decepados, é encorajado principalmente quando há muitos inimigos a distâncias diferentes do personagem controlável.
Espetáculo de cores e formas
As fases em Ape Out são geralmente cheias de longos corredores, salas espaçadas e largas pilastras de concreto, mas com uma boa variedade de elementos de cenários característicos de cada uma de suas quatro campanhas. Cada fase é geralmente bem construída tanto pela diversidade estética de cada sala quanto por intencionalmente induzir mecânicas situacionais — como no caso dos agentes especiais que atacam o Empire State Building pelas janelas. Por se tratar de um jogo que exige reflexos rápidos, muitas foram as vezes que falhei e recomecei uma fase. A sensação de aprendizado com meus próprios erros emergia principalmente quando o mapa da fase era mostrado durante o estado de falha, detalhando cada centímetro do caminho percorrido e indicando o quão avançado eu me encontrava naquele estágio. À medida que se movimenta, o gorila protagonista de Ape Out consegue enxergar mais amplamente além das estruturas ao seu redor. Isso é realmente impressionante quando se trata da imprevisibilidade do que pode vir a acontecer após cruzarmos uma sala que aparenta estar vazia, mas que esconde inimigos a cada esquina. O trabalho do artista Bennett Foddy parece simples à primeira vista, mas ele esconde um feedback visual para cada tipo de ação. Para ser mais claro: não há um indicador de pontos de vida, por exemplo, mas podemos saber se estamos prestes a falhar observando a quantidade de sangue derramado pelo gorila durante sua movimentação pelo cenário. Uma identidade visual autêntica e minimalista na medida certa, com um uso constante de silhuetas e cores contrastantes.
Selvageria sonora
Assinada pelo compositor Matt Boch, a trilha sonora de Ape Out é única: um jazz dinâmico composto apenas por percussão. Seu andamento acelera e desacelera, criando ritmos únicos a cada nova jogada por meio da sonoplastia atribuída às ações do gorila. Esse tipo de composição procedural, que está intimamente ligada ao gameplay, é um dos usos de música mais interessantes que já experimentei jogando videogames. A bateria é o único instrumento presente na trilha sonora das fases e o uso de um único instrumento (de natureza mais “agressiva”, como é o caso dos instrumentos de percussão) é justificado também pelo comentário político-ambiental assinado pelos desenvolvedores. O gorila aparenta sempre ter sido subjugado e transformado em atração no início de cada campanha e precisa escapar de qualquer maneira das garras do homem, mesmo que tenha que o fazer de modo violento. Ape Out brilha assim como outros jogos indies de ação também brilharam em seus tempos. Sua originalidade mecânica e audiovisual vai muito além de uma “cópia de Hotline Miami com gorila” — como alguns injustamente o apelidaram —, fazendo dele um forte candidato a melhor indie de 2019 para o Switch.